CÉREBRO DE PIPOCA
por Gilberto
Dimenstein*
"Quem faz muitas tarefas ao
mesmo tempo, condicionando seu cérebro, fica menos funcional. Não sabe perceber
as emoções e trabalhar em equipe, não sabe focar o que é relevante e tem
dificuldade de estabelecer um projeto que exige um mínimo de linearidade"
O
Google anunciou, na semana passada, um projeto para enfrentar o Facebook,
disposto a reinventar a mídia social. A notícia teve óbvio impacto mundial e
despertou a curiosidade sobre mais uma rodada de inovações tecnológicas,
capazes de nos fazer ainda mais conectados.
No dia
seguinte, porém, o Facebook reagiu e anunciou para esta semana uma novidade
também de grande impacto, possivelmente em celulares. Para
alguns psicólogos americanos, esse tipo de disputa produz um efeito colateral,
um distúrbio já batizado de “cérebro de
pipoca”.
Esse
distúrbio é provocado pelo movimento caótico e constante de informações,
exigindo que se executem simultaneamente várias tarefas. Por causa de
alterações químicas cerebrais, a vítima passa a ter dificuldade de se
concentrar em apenas um assunto e de lidar com coisas simples do cotidiano,
como ler um livro, conversar com alguém sem interrupção ou dirigir sem falar ao
celular. É como se as pessoas tivessem dentro da cabeça a agitação do milho
explodindo no óleo quente.
A
falta de foco gera entre os portadores do tal “cérebro de pipoca” um novo tipo
de analfabetismo: o analfabetismo emocional,
ou seja, a dificuldade de ler as emoções no rosto, na postura ou na voz dos
indivíduos, o que torna complicado o relacionamento interpessoal.
Sou
um tanto desconfiado de notícias alarmantes provocadas pelo surgimento de novas
tecnologias. Toda ruptura desencadeia uma onda de nostalgia e de temores em
relação ao futuro.
Mas
algumas pesquisas em torno do “cérebro de pipoca” merecem atenção por afetar o
processo de aprendizagem. Uma delas foi realizada em Stanford, a universidade
que, por ajudar a criar o Vale do Silício, na Califórnia, impulsionou a
tecnologia da informação.
Neste
ano, Clifford Nass, professor de psicologia social na Universidade Stanford,
apresentou, num seminário sobre tecnologia da informação, a pesquisa que fez
com jovens que passam muitas horas por dia na internet, acostumados a tocar
muitas tarefas ao mesmo tempo.
Ele
mostrou fotos com diversas expressões e pediu que os jovens identificassem as
emoções. Constatou a dificuldade dos entrevistados. “Relacionamento é algo que
se aprende lendo as emoções dos outros”, afirma Nass.
O
problema, segundo ele, está tanto na falta de contato cara a cara com as
pessoas como na dificuldade de manter o foco e verificar o que é relevante,
percebendo sutilezas, o que exige atenção.
Os
pesquisadores estão detectando há tempos uma série de distorções, como a
compulsão para se manter conectado, semelhante a um vício.
Trata-se
de uma inquietude permanente, provocada pela sensação de que o outro, naquele
momento, está fazendo algo mais interessante do que aquilo que se está fazendo.
Tome o Facebook ou qualquer outra rede social.
Chegaram
a desenvolver um programa que envia para o celular da pessoa um aviso sempre
que um amigo dela está se aproximando de onde ela está.
O
estímulo, porém, começa no mercado de trabalho. Vemos nos anúncios de emprego
uma demanda por pessoas que façam muitas coisas ao mesmo tempo.
Mas
o que Nass, o professor de Stanford, entre outros pesquisadores, defende é o
contrário. Quem faz muitas tarefas ao mesmo tempo, condicionando seu cérebro,
fica menos funcional. Não sabe perceber as emoções e trabalhar em equipe, não
sabe focar o que é relevante e tem dificuldade de estabelecer um projeto que
exige um mínimo de linearidade. Não sabe, em suma, diferenciar o valor das
informações.
Não
deixa de ser um pouco absurdo valorizar tanto os recursos tecnológicos que
aproximam as pessoas virtualmente, mas que as afastam na vida real.
Daí
se entende, em parte, segundo os pesquisadores, por que, em todo o mundo, está
explodindo o consumo de remédios de tarja preta para tratar males como a
ansiedade e a hiperatividade.
PS
– Perto da minha casa, aqui em Cambridge, há uma padaria artesanal, com mesas
comunitárias, que decidiu ir contra a corrente. Seus proprietários simplesmente
proibiram que se usasse celular lá dentro para diminuir a poluição sonora e a
agitação. Sucesso total. O efeito colateral: ficou difícil conseguir lugar.
*
Gilberto Dimenstein é colunista e membro do Conselho Editorial da Folha de
S.Paulo, comentarista da rádio CBN, e fundador da Associação Cidade Escola
Aprendiz.
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Publicado originalmente no Portal Aprendiz.
Ótimo texto! É muito bom encontrar esse tipo de leitura aqui no teu blog porque corrobora o que já foi dito tantas outras vezes [e não custa repetir]: menos é mais. Beijo e boa semana!!
ResponderExcluirQue "sacode" bom de ler Lu. Que saudade do tempo que meu netbook nao pegava na UEL(nao conectava) e sentados (amigos) em baixo de uma arvore no CECA, todos papeando, celular sem credito, livros nas maos, troca de ideias de leituras, lanchinhos baratos, teatro, papo pro ar,cara lavada.E na igreja! Nada de culto virtual e zilhoes de cds pra comprar, mas cultos na chacara,acampamento com a familia, 2 cultos por domingo!! Meu Deus...
ResponderExcluirCade o cafe com bolinhos?
bjs
Suzue